quarta-feira, 14 de abril de 2010

Os Noivos - Nelson Rodrigues. [2]

O Idílio.

Foi um namoro tranqüilo, macio, sem impaciências, arrebatamentos. Sob a inspiração paterna, ele planificou o romance, de alto a baixo, sem descurar de nenhum detalhe. Antes de mais nada, houve o seguinte acordo:

— Eu não toco em ti até o dia do casamento.

Edila pergunta:

— E nem me beija?

Enfiou as duas mãos nos bolsos:

— Nem te beijo. OK?

Encarou-o, serena:

— OK.

Dir-se-ia que este assentimento o surpreendeu. Insinua:

— Ou será que você vai sentir falta?

— De quê?

E Salviano, lambendo os beiços:

— Digo falta de beijos e, enfim, de carinho.

Sorriu, segura de si:

— Não. Estou cem por cento com teu pai. Acho que teu pai está com a razão.

Salviano não sabe o que dizer. Edila continua, com o seu jeito tranqüilo:

— Sabe que essas coisas não me interessam muito? Eu acho que não sou como as outras. Sou diferente. Vejo minhas amigas dizerem que beijo é isso, aquilo e aquilo outro. Fico boba! E te digo mais: eu tenho, até, uma certa repugnância. Olha como eu estou arrepiada, olha, só de falar nesse assunto!

O Velho.


Desde menino, Salviano se habituara a prestar contas quase diárias ao pai, de suas idéias, sentimentos e atos. O velho, que se chamava Notário, ouvia e dava os conselhos que cada caso comportava. Durante todo o namoro com Edila, seu Notário esteve, sempre, a par das reações do filho e da futura nora. Salviano, ao terminar as confidências, queria saber: "Que tal, papai?". Seu Notário apanhava um cigarro, acendia-o e dava seu parecer, com uma clarividência que intimidava o rapaz:

— Já vi que essa menina tem o temperamento de uma esposa cem por cento. A esposa deve ser, mal comparando, e sob certos aspectos, um paralelepípedo. Essas mulheres que dão muita importância à matéria não devem casar. A esposa, quanto mais fria, mais acomodada, melhor!

Salviano retransmitia, tanto quanto possível, para a namorada, as reflexões paternas. Edila suspirava: "Teu pai é uma simpatia!". De vez em quando, o rapaz queria esquecer as lições que recebia em casa. Com uma salivação intensa, o olhar rutilante, tentava enlaçar a pequena. Edila, porém, era irredutível; imobilizava-o:

— Quieto!

Ele recuava:

— Tens razão!

Catástrofe.

Um dia, porém, o dr. Borborema, que era médico de Edila e família, vai procurar Salviano no emprego. Conversam no corredor. O velhinho foi sumário: "Sua noiva acaba de sair do meu consultório. Para encurtar conversa: ela vai ser mãe!". Salviano recua, sem entender:

— Mãe?!...

E o outro, balançando a cabeça: "Por que é que vocês não esperaram, carambolas? Custava esperar?". Salviano travou-lhe o braço, rilhava os dentes: "De quantos meses?". Resposta: "Três". Dr. Borborema já se despedia: "O negócio, agora, já sabe: é apressar o casamento. Casar antes que dê na vista". Petrificado, deixou o médico ir. No corredor do emprego, apertava a cabeça entre as mãos: "Não é possível! Não pode ser!". Meia hora depois, desembarcava e invadia, alucinado, a casa do pai. Arremessou-se nos braços de seu Notário, aos soluços.

— Edila está nessas e nessas condições, meu pai! — E, num soluço mais,fundo, completa: — E não fui eu! Juro que não fui eu!


(...) Continua...

6 comentários:

  1. O anjo pornográfico: clássico.
    Mal humorado, pornográfico (apesar de ser romântico), tricolor fanático e... gênio.
    Muito bom vc postá-lo e conhecê-lo, parabéns.

    abç
    Lunaticools

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  2. Ameis eu Blog
    estou te seguindo
    me segue tbem
    http://conexaoopop.blogspot.com/
    bgs

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  3. aff, continua, marilia! estou louca para saber quem é o pai. adorei, adorei hduhasdiohadauhd.

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  4. POSTAAAAAAAAAAAAAA-A-A-A-A-AAAAA!

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